Aviação civil, regulação nebulosa?

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Aviação civil, regulação nebulosa?

Mensagem por MARR »

Aviação civil, regulação nebulosa?
O Estado de S. Paulo - 30/04/2005
Diante da crise que atinge o transporte aéreo, como situá-lo perante a questão da regulação? Primeiramente, a regulação do transporte aéreo não pode ser apartada de um ambiente regulador abrangente, capaz de propiciar uma ação coordenada e integradora, ante os diversos componentes do Sistema Nacional de Aviação Civil. Por outro lado, o transporte aéreo constitui um dos mais complexos casos de regulação econômica, pela sua dualidade intrínseca de atividade econômica, sujeita à competição acirrada do mercado; e de serviço público concedido, objeto de normas, regras e controles. Dada a dinâmica do mercado, não se mostram adequadas nem a regulação rígida baseada em burocracias pesadas - geradoras de proteções e sanções - nem o que se convencionou de chamar de "desregulamentação".

As experiências norte-americanas e européias mostraram que abrir mão da regulação pode levar à guerra tarifária e à competição predatória, em detrimento da qualidade e segurança dos serviços prestados. Hoje, o grande desafio da regulação econômica na aviação civil brasileira é o de como conciliar as exigências do mercado com os necessários controles públicos.

Não se pode dissociar, também, a regulação do transporte aéreo doméstico do ambiente internacional. As mudanças institucionais e econômicas iniciadas nos EUA com a "liberalização" dos vôos domésticos promoveram a adesão dos Estados e de alguns países que desregularam e harmonizaram suas legislações com a norte-americana. Nos anos 1990, os EUA conduziram um amplo processo de liberalização internacional por meio da política de "Céus Abertos", em acordos bilaterais. No entanto, dada a complexidade dos fatores envolvidos, pouco foi feito em termos multilaterais. Apesar da relutância de muitos países em abrir mão da sua soberania sobre o espaço aéreo, os EUA têm hoje mais de 60 acordos bilaterais desta natureza. Por terem sido firmados esses ajustes com países europeus, a União Européia (UE) tenta substituir os acordos bilaterais dos seus Estados membros por um acordo global. A dificuldade, no caso, é quanto à inclusão ou não dos serviços domésticos, à preservação das vantagens de acesso ao mercado norte-americano e ao reconhecimento da soberania de cada Estado.

Todavia, a desregulamentação norte-americana não conseguiu prever (e a política de "Céus Abertos" agravou): 1) O poder de mercado das megaempresas; 2) o impacto dos novos sistemas de aglutinação nos aeroportos âncoras ("hub-airports"); e 3) a força dos sistemas de reserva, que favoreceram poucas empresas. O pensamento liberal de que "uma empresa aérea é nada mais que um custo marginal com asas" se revelou atônito com os rumos tomados pela desregulamentação. Toda esta evolução levou o governo norte-americano a buscar formas de introduzir limites para o transporte desregulado e buscar novos parâmetros de regulação, culminando numa proposta legislativa visando a uma ampla reestruturação do setor. O Air Transportation Competition Restoration Act procurou restringir a concentração excessiva entre empresas aéreas, por meio de contrapesos dentro do sistema de transporte aéreo como um todo. A tendência nos EUA é, portanto, a da "re-regulação" e de um certo retorno ao intervencionismo. Enquanto isso, a UE busca a flexibilização interna para acomodar o transporte "doméstico" e tenta neutralizar os acordos bilaterais de "Céus Abertos".

Em vista de toda essa complexidade, causa surpresa que, no bojo do projeto de criação da nova Agência Nacional de Aviação Civil, setores do governo estejam pensando em adotar políticas de desregulamentação e de concessões às demandas de céus abertos. Isto em detrimento de uma regulação que propicie maior estabilidade e fortaleça o transporte aéreo nacional. É preocupante também que, tomados de súbito espírito civilista, queiram alijar da montagem do novo arcabouço institucional aqueles que têm uma inegável experiência consolidada ao longo de seis décadas. Militares e civis devem unir esforços para aportar seus conhecimentos na defesa dos interesses do País. E estar conscientes de que nem a liberalização descontrolada, nem a rigidez intervencionista trarão benefícios para o atual estágio da nossa aviação civil. O ambiente ideal de regulação será aquele baseado, fundamentalmente, em independência, informação, autoridade, direção e liderança, e não em vinculações políticas geradoras de "proteções", que perpetuam a dependência. Parafraseando a genial definição do Millôr sobre direita e esquerda, pode-se dizer que "a diferença fundamental entre liberais e estatizantes é que os primeiros acreditam cegamente em tudo o que lhe ensinaram e os segundos, cegamente em tudo o que ensinam".Josef Barat, consultor, é membro do Conselho de Economia e Política da Federação do Comércio do Estado de São Paulo
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